Visto, Lido e Ouvido

Sonho pressagioso

Com base em fatos e não em ficção, o cenário à nossa volta vai mostrando a encruzilhada que a humanidade tem pela frente. De fato, o século 21 vai se misturando com narrativas distópicas de ficção científica a tal ponto que não sabemos onde começa uma e termina a outra

Opinião 0805 -  (crédito: Caio Gomez)
Opinião 0805 - (crédito: Caio Gomez)

Curiosamente, o século 21 vai se transformando — e até se confundindo — com as milhares de histórias de ficção científica que retratam mundos distópicos, devastados por guerras insanas de extermínio nuclear. Com base em fatos e não em ficção, o cenário à nossa volta vai mostrando a encruzilhada que a humanidade tem pela frente. De fato, o século 21 vai se misturando com narrativas distópicas de ficção científica a tal ponto que não sabemos onde começa uma e termina a outra.

Embora ainda não estejamos num cenário de destruição total por guerra nuclear, vários fatores concretos parecem conduzir a humanidade a uma encruzilhada crítica. Numa análise rápida, baseada apenas em fatos que sustentam essa percepção, temos a volta do fantasma nuclear. Desde o fim da Guerra Fria, a ameaça de uma guerra nuclear havia recuado para o pano de fundo das preocupações globais. No entanto, o século 21 tem visto um recrudescimento das tensões entre potências nucleares. O conflito entre Rússia e Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), motivado pela invasão da Ucrânia pela Rússia em 2022, reintroduziu de forma explícita a retórica nuclear. O Kremlin chegou a sugerir o uso de armamento atômico em caso de avanço ocidental. Vimos ainda a corrida armamentista moderna, com os Estados Unidos, China e Rússia, continuamente, modernizando seus arsenais.

Em 2024, relatórios da Stockholm International Peace Research Institute ( Sipri) apontaram que houve um grande aumento nos gastos com armas nucleares. Com isso, há uma espécie de proliferação nuclear, com países como Coreia do Norte prosseguindo em seus testes, enquanto, por outro lado, o acordo nuclear com o Irã segue ameaçado e ameaçando. Hoje, existem, aproximadamente, estocadas, em várias partes do globo, 13 mil ogivas nucleares. Bastariam apenas algumas centenas delas para causar um colapso climático e civilizacional em âmbito global. Um mundo coberto por gelo radioativo, decorrente do inverno nuclear, que se instalou na paisagem geral. Este é bem um cenário de ficção, embora possível agora.

Outro aspecto a dar um pano de fundo para a distopia do século 21 é representado pela emergência climática: a distopia silenciosa. Se a guerra nuclear representa uma catástrofe súbita, a crise climática é uma distopia em câmera lenta, mas de igual poder de devastação. Lembremos que eventos recentes e extremos aumentaram exponencialmente, com incêndios florestais, enchentes catastróficas e ondas de calor severas se tornaram mais frequentes e intensas. O Brasil, por exemplo, viveu, em 2024, a maior tragédia climática de sua história no Rio Grande do Sul. Há, nesse ponto, a emergência da chamada "desigualdade climática", que incide justamente sobre os países que menos contribuíram para a crise climática, formando, assim, o conjunto dos mais afetados, provocando deslocamentos em massa e crises humanitárias de grandes proporções.

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Segundo o Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), a humanidade tem até 2030 para cortar drasticamente as emissões de carbono se quiser evitar um aquecimento global acima de 1,5 °C — limiar considerado crítico. Nesse conjunto surrealístico, advém ainda a crise democrática e a tecnovigilância, criando um ambiente de paranoia e de medo generalizado. A ascensão do autoritarismo, aliada ao uso de tecnologias de controle, aproxima o mundo de narrativas distópicas como 1984 ou Black Mirror. Nesse ponto, a vigilância digital, como no caso da China operando, agora, o maior sistema de vigilância do planeta, com reconhecimento facial, pontuação social e controle informacional. Mas o que chama a atenção é que esse fenômeno se alastra de forma rápida e globalmente.

A desinformação e a polarização provocadas pelas redes sociais e IA estão sendo usadas para manipular eleições, disseminar fake news e radicalizar populações, criando grupos antagônicos. Na verdade, se formos ficar apenas por aqui, teríamos todos os elementos que moldam as ficções. De acordo com o Relatório Freedom House de 2024, a liberdade global caiu pelo 18º ano consecutivo. A democracia está em declínio em diversas partes dos continentes. De fato estamos diante da maior encruzilhada da humanidade. Estamos diante de escolhas que definirão os rumos da civilização para além desse século. Ou seguimos pelo caminho da cooperação global, transição ecológica, o que obriga a diminuição drástica dos gastos com armas de destruição em massa.

Nesse ponto surge ainda a possibilidade de uma desmilitarização em âmbito global. Mas isso exige esforços coletivos e reformas sistêmicas profundas, mas não impossíveis. A equação é simples: ou continuamos nos encaminhando para colapsos múltiplos — ambientais, geopolíticos e sociais —, que transformariam o planeta em algo próximo aos mundos retratados pela ficção distópica, ou agimos com todas as forças que temos, para acordar desse sonho pressagioso.

A frase que foi pronunciada:

"Nós sabemos tudo sobre a vida selvagem, pelo amor de Deus!", gritou Aideen. "Estamos sendo atacados por uma maldita matilha de chimpanzés agora mesmo! Tirem a gente daqui!"

Steven Decker, O equilíbrio do tempo

História de Brasília

E já que o assunto é IAPC, o sr. José Jereissati ia despejar os que não pagam aluguel, e o assunto saiu da pauta. Há muita gente alta no meio.
(Publicada em 3/5/1962)


postado em 15/05/2025 06:15
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